Coçava as frieiras do pé com um prazer que me fazia olhar estarrecido por diversas vezes aquela cena que, ultimamente, andava se repetindo à grande. Dizia que sentia o mesmo gozo de quando se masturbava olhando pro fundo dos olhinhos muito miúdos da gorda filha da vendedora de pilhas que se encostava no muro do nosso prédio. Um dia me revelou, embora eu não tenha certeza ser verdade até hoje, que nunca teve coragem de transar com ela. Achava que seus olhos tinham ternura em excesso, e, por mais que ela quisesse que ele fizesse a coisa, o máximo que ele fazia era deixar que ela ficasse sentada e quieta, enquanto ele olhava muito fundo nos olhos dela e via ali algum ponto excitante qualquer que o combalia a auto-satisfazer-se furiosamente. A gorda não ficava quieta, queria participar - era uma mulher, estava ali, e tudo o que ele queria era que ficasse olhando? Nessas horas ele batia na cara dela com o cinto que tinha tirado para que o tilintar da calça arriada ao sacudir não acordasse nosso vô que dormitava no quartinho ao lado. Tanto era o silêncio que tinham que fazer, que ele se atirava sobre a cara da gorda quando ela se punha a chorar por que ele atingira o clímax, gozando violentamente contra a parede, e ela não tinha participado daquele momento. Não da maneira que ela queria. Ele, de calças ainda arriada, passava seus dedos grossos nos lábios da gorda e dizia que ela não devia se corromper assim. Havia alguém muito especial para ela e, por enquanto, aquilo era tudo o que eles poderiam ter.
Encontre o que você procura
.
Alessandro Garcia nasceu em 1979, em Porto Alegre. Autor de A sordidez das pequenas coisas (Não Editora, 2010), finalista do Prêmio Jabuti 2011, segundo colocado no Prêmio Clarice Lispector, da Fundação Biblioteca Nacional e com conto traduzido para o espanhol na Revista Machado de Assis, da Fundação Biblioteca Nacional.
Em 2016 participou, com o conto Cachorro correndo sem cabeça, da coletânea Cobain. Em 2015, publicou Agora que Estamos de Volta pelo selo Formas Breves, da e-galáxia, editora na qual também participou da coletânea Contos de Natal, em 2014. Publicou nas coletâneas É Assim que o Mundo Acaba (Editora Oito e Meio, 2012), Assim você me mata (Terracota, 2012), Ficção de Polpa Vol. 3 (Não Editora, 2009), Ficção de Polpa Vol. 1 (Fósforo, 2007; Não Editora, 2008) e em revistas como Ficções e Cult, além de ter conto traduzido para o inglês no Contemporany Brazilian Short Stories e para o espanhol da Cuentos Brasileños de la Actualidade.
Escreveu o perfil do escritor Jonathan Franzen para o livro Por que Ler os Contemporâneos? (Dublinense, 2014). É editor da revista de contos Flaubert.
Arquivo
Booktrailer
SOBRE
- Resenha Amálgama: "Um grande livro."
- Resenha Digestivo Cultural: "A sordidez de Alessandro Garcia"
- Resenha Ivana Arruda Leite: "A sordidez das pequenas coisas"
- Resenha Meia Palavra: "A sordidez das pequenas coisas"
- Entrevista no Paralelos: O Globo Online
- Entrevista programa Estação Cultura, TVE
- Booktrailer de "A sordidez das pequenas coisas"
- Sinopse Não Editora
- Resenha do "Ficção de Polpa".
- Entrevista no Portal Literal
- [MAIS]