Blá, blá, blá, sabemos que quadrinhos há muito deixaram de ser encarados somente como diversão infantil/adolescente. Eu, há muito, venho mergulhando na leitura destes, conforme apontado em alguns comentários por aqui e uma e outra tentativa de resenha, considerando a mais bem sucedida delas a de Fun Home, que acho uma obra sensacional, ainda que possa ser considerada um tanto pedante. Enfim. Para mais, retorne aqui. Depois disto encarei leituras sensacionais e outras nem tanto, enfileirando aí Mesmo Delivery, obra incrível de Rafael Grampá; Retalhos, de Craig Thompson, de deslumbrante resultado estético mas meio raso narrativamente; Umbigo sem fundo, de Dash Shaw; Gourmet, de Taniguchi & Qusumi e há pouco terminando o perturbador Como uma luva de veludo moldada em ferro, de Daniel Clowes, mesmo autor de Ghost World. Sobre Como uma luva..., em breve discorro aqui, bem como sobre Black Hole, também em fase de leitura.
Mas o post é para discorrer sobre uma obra que nem pode ser enfileirada no rol mais sofisticado destas graphic novels descritas aí em cima. Pop até a medula, é quase um mangá, com tanto apelo popular que está virando filme. Não obstante, seguindo recomendações confiáveis e também confiando no meu instinto, fiz de Scott Pilgrim contra o mundo minha leitura dinâmica e não só me diverti muito como passei a admirar o autor por conseguir incluir em uma obra bastante popular um tipo de humor repleto de uma ironia que foge do raso divertimento comumente assegurado a uma obra que pode ser definida como adolescente.
De autoria de Bryan Lee O'Malley, Scott Pilgrim é um fenômeno nos Estados Unidos, indo já para o sexto volume e chamando atenção da mídia especializada em cultura pop. Depois de algum tempo, a série saiu por aqui através da coleção Quadrinhos na Cia., da Cia. das Letras, já contendo os dois primeiros volumes. A trama, ao mesmo tempo básica, tem um nonsense que poderia afugentar, mas que conquista justamente por isto: o protagonista é um canadense de vinte e tantos anos, que vive do ócio e da atividade como baixista de uma banda chamada Sex Bob-omb. Além do fato bizarro de dividir o apartamento de peça única com o melhor amigo Wallace (e dividir também a única cama com ele, sem esquecer do fato de Wallace ser gay e isto render piadas a série inteira), Scott se apaixona pela enigmática Ramona Flowers, fato que deveria ser prosaico mas que desencadeia a ira da "Liga dos Ex-Namorados do Mal", simplesmente a trupe de sete ex-parceiros de Ramona que se unem para acabar com Scott. Toda a série trata exatamente disto: Scott enfrentando os ex-namorados de sua amada. Bobo? Se fosse só repleto de videogame, rock, namoros e bandas de rock, provavelmente sim. Como é carregado de ironia visual e narrativa, em um ritmo alucianante próprio de mangás e nem um pouco condescendente com seu protagonista, a série é muito divertida. Não há toa ganhou adaptação cinematográfica com o sempre hilário Michael Cera. Criativo, Scott Pilgrim é sobre crescer e tudo aquilo o que precisa ser dito para esta fase espinhenta da vida, mas despretensioso, consegue gerar identificação até para quem já passou por esta fase, em sua auto-ironia e com seu heroísmo distante do sentido HQ da palavra.