O ar cheira a ligustros, granitina e
excitação pós-púbere.
A tateante aranha de dedos de Madison
permite-se ficar tempo muito mais do que necessário exercendo pressão úmida
sobre a mão de Ignacio. É como uma luta livre de maciez coroada pelo ir-e-vir
do mindinho, elucidando a intenção daquilo o que já não deixa a menor dúvida. Na
rua, o frio é congelante e a chuvinha fina é só uma irritação a mais,
tamborilando na janela do anfiteatro da universidade. Ela se inclinou para mais
perto dele, não perto demais mas, sim,
perto demais, e é esta proximidade calculada em milimetrismo que permite o
tom baixo, ritmo cadenciado pelo ainda ir-e-vir do mindinho em sua mão,
reduzindo a voz ao que é quase-sussurro — “mais
uma vez, seu argumento foi perfeito”. Ele ainda consegue externar-se ao que
vai além da pequena bolha que lhes envolve — na plateia à meia-luz se vê o
brilho dos smartphones refletindo na
tez lustrosa dos estudantes que restam, ocupados em redigirem espirituosas
máximas de cento e quarenta caracteres enquanto aguardam o carro de alguém que
os levará a lugar quente e distante. Retira sua mão com a desenvoltura de quem só
vai apoiar a alça da pasta de maneira mais firme no ombro e diz o que todo
professor precisa dizer diante do que é óbvio, o que diz toda vez que, ao fim
de um de suas palestras, uma aluna se detém a segurar sua mão, alisando o
próprio cabelo em quantidade muito superior ao comum, suavidade do toque e da
voz muito mais intensa do que o comum. “Fico
feliz que você tenha gostado, Madison”, Ignacio diz. O toque dele em seu
ombro, quando decide ir em frente, sempre que decide ir em frente, é
apropriado, ainda que permaneça tempo muito mais do que necessário. É e sempre
interrompido pelo gesto de segurar o cartão com o número de telefone que elas
lhe alcançam, antes de subirem a escadaria em direção à porta dupla sobre a
qual se lê Saída de Emergência, só um pouco mais apressadas do que o comum.
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Salobro, conto inédito meu, disponível na íntegra para leitura na Flaubert. Clica e vai.